Texto: Ricardo Neto, Melba de Ceita, Neisy Sacramento ** Foto: Lourenço da Silva
São-Tomé, 12 Marc ( STP-Press ) – O Presidente são-tomense, Evaristo Carvalho declarou quarta-feira na abertura do novo ano Judicial, que “ a nossa justiça vai mal” e que “sistema está perto da insolvência”, enquanto o Presidente do Supremo, Silva Cravid declarou que “ não existe um sistema de justiça perfeito” e que as “sementes espalhadas” no sector já estão “brotando e crescendo numa direção correta”.
A cerimónia contou ainda com discurso do Primeiro-Ministro, Jorge Bom que defendeu “diálogo entre decisores políticos” no processo de reforma da Justiça, o Procurador-Geral, Kelve de Carvalho reafirmou “entendimento entre todos intervenientes do processo judiciário” para a melhoria do sector e a Bastonária dos Advogados, Célia Pósser, que chamou atenção para o “aumento “gritante da criminalidade” e “uso abusivo da previsão preventiva”.
Indo por partes, comecemos por Presidente da República Evaristo Carvalho que no seu discurso sublinhou que “ muito se tem falado da justiça no nosso País, dentro e fora dele e, não sem razão. A nossa justiça vai mal e temos que reconhecer que não fizemos tudo que esteve ao nosso alcance para melhorar a situação”.
“ Temos de aceitar que o nosso sistema está perto da insolvência, mas não podemos decretar a sua falência e muito menos a sua liquidação. O caminho certo será a sua recuperação em moldes que defenda e proteja os interesses da comunidade. Quer a democracia quer a ordem não podem abdicar da justiça”, disse Evaristo Carvalho.
O Chefe de Estado são-tomense denunciou ainda que “ assistimos uma inquietante promiscuidade no sistema judicial. É quase impossível distinguir quem fiscaliza, quem sanciona e quem é fiscalizado”, tendo concluído que “ é óbvio que isto não ajuda na melhoria do sistema”.
“É igualmente urgente que os magistrados judiciais se concentrem nos processos judiciais e deixem as tarefas administrativas e até mesmo logísticas a cuidado de outros órgãos” disse, Evaristo Carvalho, sustentando que “ os magistrados têm de saber que não fazem favores nenhum à ninguém, quando decidem um processo ou aceleram a marcha nos temos e em condições fixados por lei. É, seu dever, sua obrigação e de nada lhe servem os direitos, regalias e outras mordomias de que goza se assim não for”.
Tendo declarado que “ a corrupção é uma realidade no nosso País e vem assumido proporções, cada dia, mais alarmantes. Tão séria é a problemática da corrupção que ela tem de ser combatida tenazmente”, Presidente Evaristo defendeu que “ combater corrupção, seletivamente, ou distinguir a boa da má corrupção é o mesmo que legalizar a corrupção ou permitir que ela se alastre por todo o País, visto de conexões interpessoais e interpartidárias existentes. Só perdem o país, a nação, o povo e nosso futuro”.
“ Não estaria a fazer uma boa publicidade para o País. Mas, a verdade crua e nua, patente aos olhos de todos é que a criminalidade tem vindo a aumentar e assumindo forças cada vez mais violentas e complexas” disse para depois acrescentar que “ as causas são diversas, mas a nossa responsabilidade é total … é, preciso fazer mais para proteger os mais fracos”.
“Não existe sistema perfeito”, – Silva Cravid
Já no seu discurso, o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Silva Cravid disse que “ não existe um sistema de justiça perfeito”, tendo sublinhado que “ fruto das soluções encontradas com a intervenção do sector judiciário, hoje em São Tomé e Príncipe embora ainda não tivesse formado um sistema judicial esperado e desejado, é de realçar que as sementes da legalidade e imparcialidade espalhadas em todos sectores do sistema judicial estão brotando e crescendo numa direcção correcta”.
“ As dificuldades reias são comuns a todos os sistemas de justiça e não existe apenas no sistema judicial são-tomense” disse Silva Cravid, acrescentando que “ todos são passiveis de críticas e permanente melhoramento” citando ainda que “ veja-se o que está agora a acontecer em Portugal com fortes suspeitas na viciação dos Sorteios dos processos e fortes contestações da justiça em muitos outro Países. Os homens é que ditam a justiça, sendo os homens imperfeitos, naturalmente a justiça nunca será perfeita”.
O Presidente do Supremo disse ainda que “ o sistema judicial são-tomense se encontra num mega processo de reforma, a qual se chamou e bem de “modernização da justiça”, mas nunca esqueçamos que para termos sucessos visíveis, essa reforma tem que ser consentânea com a reforma do Estado, do Poder Politico, da Administração Pública, das forças militares em suma dos poderes do Estado”
“ Daí defendemos que a reforma é um processo inclusivo, gradativo e permanente. É uma matéria sensível que se integra exclusivamente na política da justiça de cuja competência é do governo em concertação com a Assembleia Nacional”, – sustentou Silva Cravid.
Tendo declarado que “ ainda que nem tudo tenha sido positivo, pode-se dizer que 2019 foi um bom ano para a justiça em São Tomé e Príncipe”, sublinhado que “ foi um bom ano naquilo que é mais importante para qualquer democracia, a independência dos juízes e dos tribunais”.
Urge diálogo entre decisores políticos, Bom Jesus
No seu discurso, o primeiro-ministro, Jorge Bom Jesus disse que “ o governo através do ministério da Justiça assumiu a liderança política do projecto de modernização da justiça são-tomense” sublinhando tratar-se de “ de um processo holístico, amplamente inclusivo, participativo, de todos para todos, em que todos terão vez e voz, inclusivamente diáspora, e ninguém será posto de lado, muito menos ficar para trás.
“ A reforma da justiça está em curso sob diversas; e a descentralização dos serviços centrais para os distritos é uma realidade incontornável e condições estão a ser criadas para que tanto o Tribunal de Lembá, como da Região Autónoma do Príncipe funcionem nas melhores condições e a breve trecho” – disse Jorge Bom Jesus.
Tendo declarado que “ urge portanto, um relacionamento institucional mais profícuo e entre os decisores políticos, mais diálogo, aproximação e colaboração, numa perspectiva de cultura de resultado”, Bom Jesus solicitou “toda a contribuição dos decisões e fazedores da justiça para a análise criteriosa da proposta do governo sobre a reestruturação da nova grelha salarial. Haverá abertura para diálogo e consenso”.
“ Preocupa-nos, sobremaneira, os dados da polícia judicia-2019, chegados ao nosso conhecimento, mais de 700 casos de furto qualificado, várias dezenas de casos de ofensas corporais e violência doméstica e mais 50 casos de abuso sexual e violação, daí que pedimos maior articulação e cumplicidade entre PJ e a Procuradoria-Geral da República e mão dura e tolerância zero para abuso sexual de menores” disse Jorge Bom Jesus.
Entendimento precisa-se,- Kelves de Carvalho
Na sua intervenção, O Procurado Geral da República, Kelve de Carvalho disse que “ no ano de 2019 tivemos um total 3208 novos processos crimes instaurados, o que constitui um aumento de mais de 33,41% em relação ao ano 2018, e devido a medidas gestionárias e de metodologia de trabalho, a pendência que no ano 2018 andavam a volta de 7 mil processos hoje dia 11 de Março é de apenas 4 mil inquéritos. Ou seja, conseguimos uma redução das pendencias processuais a volta de 43%” .
“ Os números ora apresentados faz-nos lembrar o que um dia disse o filósofo português Agostinho da Silva: Tudo vence uma vontade obstinada, do homem que integrou na sua vida o fim a atingir e que está a todos os sacrifícios para cumprir a missão que a si próprio impõe” disse Kelve de Carvalho, sublinhado que “ não só se conseguiram diminuição as pendencias processuais das instruções preparatórias como o tempo médio de duração dos inquéritos crimes é cada vez mais curto, a taxa de condenação nos julgamentos hoje é acima de 75%”.
“ Quero realçar a cuidadosa presença e selectiva atenção que Presidente da República tem prestado a questão da justiça, principalmente na iniciativa que culminou com a assinatura da acta de declaração de princípios em Setembro passado pelos mais altos dirigentes das Nações Unidas visando o engajamento de todos para uma urgente modernização da justiça” disse Nobre de Carvalho.
“ Uma palavra de muito apreço a sua Excelência o Presidente da Assembleia Nacional, figura cimeira da nossa democracia. Senhor Primeiro-Ministro e Chefe do Governo. O dialogo mantido ocasionalmente como a Vossa Excelência ao logo do ano tem sido aberto, cordial e honesto”. Disse De Carvalho, sublinhando que “ Senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça e a Senhor Bastonária da Ordem dos Advogados. Sempre defendi e continuo a defender que uma justiça melhor só é possível com a colaboração, a cooperação e entendimento entre todos intervenientes do processo judiciário.
Uso Abusivo da prisão preventiva – Célia Posser
No seu discurso, a Bastonária da Ordem dos Advogados de São Tomé e Príncipe, Célia Posser disse que “ a justiça tem vivido nos últimos tempos um discurso público que gira a volta do valor monetário em detrimento dos valores da dignidade do cidadão”, tendo sublinhado que “ aqueles que não têm condições financeiras não têm direito, cada vez é exigido ao cidadão o poder monetário para que possa ver os seus direitos, interesses legítimos defendidos”.
Além de ter defendido a revisão da obrigatoriedade da prática do réu responder de pé em audiência, independentemente, a idade e da sua condição física, a Bastonária Célia Posser lamentou também questões relativas a data e hora das audiências sublinhando que “propomos que as datas das audiências de julgamentos passam a indicar a hora, inicio e fim para ajudar a determinar o tempo necessário para cada tipo de caso”.
Ainda no seu discurso, a Bastonária Célia Posser chamou atenção para o aumento “gritante” da criminalidade no País, do alegado “uso abusivo de prisão preventiva”, a superlotação da cadeia, incumprimento nos indulto do Presidente da República a necessidade de representação efectiva do ministério público e tribunal na Região autónoma do Príncipe, tendo ainda anunciado a aplicação de poderes disciplinares da Ordem aos advogadores que, eventualmente, violarem as regras básicas da ética e deontologia bem como deslealdade para com os seus constituintes em pleno exercício das suas funções.
Fim/RN
Pode ouvir Evaristo Carvalho, Silva Cravid, Bom Jesus, Kelve C. e Célia Posser