Wildiley Barroca, Secretário Geral da UNEAS em homenagem a Dona Alda
São-Tomé, 10 Marc ( STP-Press ) – “ E já lá vai uma Década” foi este o título do texto em homenagem a Alda Espírito Santo por 10ª aniversário do seu falecimento, lido por Wildiley Barroca, Secretário-Geral da União Nacional dos Escritores e Artistas são-tomenses, segunda-feira em cerimónia presidida pelo Presidente do Parlamento, Delfim Neves, na presença da ministra da Cultura, Graça Lavres e ministra dos Negócios Estrangeiros, Elsa Pinto, entre outros convidados
Enviado por email a STP-Press, Pode ler na íntegra o relevante texto de Wildiley Barroca, Secretário-Geral da União Nacional dos Escritores e Artistas de São Tomé e Príncipe em homenagem, a figura emblemática da luta pela independência de São Tomé e Príncipe.
E JÁ LÁ VAI UMA DÉCADA …
Com a leveza de um pássaro voando
nas belas e tranquilas paisagens do sul, o tempo como que também esvoaçou e eis
que, quase que sem nos darmos conta, dez anos se passaram sobre o falecimento
daquela que incarnou, como poucos, a expressão dos sentimentos identitários dos
santomenses e que mereceu destes o afecto, o respeito e a consideração, apenas
conferidos aos que se entregam, com genuína seriedade e convicção, à nobre
acção de os representar.
No caso
vertente, a professora, poetisa e activista política, Alda Espírito Santo.
Falar dela é retornar
inevitavelmente ao passado, pois foi há dez anos que desapareceu aos nossos
olhos, a mulher intrépida da militância desde jovem nos círculos
político-literários africanos de Lisboa, onde pontificavam reputados patriotas
africanos, oriundos das colónias sob o jugo de Portugal, que aliados aos
antifascistas e anticolonialistas daquele país, se entregaram, com empenho e
destemor, à luta pela dignificação dos africanos e de emancipação dos seus
destinos; a autora de chocantes versos repudiando, com veemência e dor, os
trágicos ventos de loucura que, em Fevereiro de 1953, varreram a ilha e levaram
na sua irracionalidade centenas e centenas de mulheres e homens inocentes.
Ela foi ainda a jovem arrojada que, enfrentando
a severidade das temerosas forças policiais do regime colonial, não temeu
conceder apoio ao advogado Dr. Palma Carlos, enviado em nosso socorro, e
expeliu dezenas de cartas ao exterior, pelas quais exteriorizava a repugnância
que sentia pelos hediondos acontecimentos perpetrados pelo colonizador sem
escrúpulos; o afã colocado no apoio, em pleno regime colonial, à emancipação
cultural dos jovens santomenses, incitando-os à leitura, pelo empréstimo de
obras dos mais reputados escritores progressistas da época, de que eu próprio,
estudante ainda do liceu, fui um dos beneficiários; enfim, a sua preciosa
contribuição, de índole política e literária, como Ministra da Educação e
Cultura e Presidente da Assembleia Nacional, e a criação, em 1985, da União dos
Escritores e Artistas Santomenses, de que foi sempre a dinâmica Presidente.
Para quem, como vós, a acompanhou
no difícil processo de criação desta instituição, perdura a imagem plena de
determinação do seu rosto incentivando-nos a seguir em frente, prova da sua
inigualável capacidade de incutir nos que com ela operavam a ideia de que,
juntos, eram capazes de atingir os desejados objectivos, ciente como era de que
a única luta que se perde é aquela que se abandona.
Recorde-se ainda que, membro do
escol de dirigentes que então se evidenciou no projecto conducente à
independência de S. Tomé e Príncipe, Alda Espírito Santo, embrenhando-se na
estrada da imaginação, sacou do recanto mais profundo do seu ego patriótico o
texto do que seria (e é ainda) o Hino Nacional, cujos versos retratam, de forma
assaz indesmentível, o seu fervoroso apego à terra e ao povo, ao consenso, à
solidariedade e à conjugação de esforços na nobre defesa dos interesses
nacionais, num apelo para que o futuro se pudesse consubstanciar num ciclo
histórico favorável à sua ditosa concretização.
Eis-nos, agora, na cerimónia com
que honramos, uma vez mais, a memória de Alda Espírito Santo, tendo bem
presente que não nos devemos eximir ao reencontro com a convicção que ela
exprimia ao reiterar que estamos do mesmo lado da canoa, bem assim, a
persistência que colocava nos empreendimentos sob a sua direcção,
Dez anos após a data fatídica do
seu desaparecimento, perpassam por nós um fluxo extraordinário de recordações
de uma personalidade de rara dimensão histórica, cultural, política e cívica.
Por tudo isso, recordar Alda
Espírito Santo é rememorar o exemplo de uma mulher em que a coragem, a
frontalidade, a persistência, o inconformismo e o fervoroso amor pátrio
constituíram traços destacados da sua personalidade.
Disse um dia o poeta, numa
fatídica referência à morte: “não mais verás a chuva a bater na vidraça, /nem
ouvirás o rumor do vento na floresta, /nem as aves abrindo as janelas da
manhã”(1).
Ora, se é verdade que já não somos capazes de ter de
novo entre nós aquela que tanto se empenhou em prol da UNEAS e da cultura
santomense, de que era como que a irredutível depositária, apropriemo-nos
então, orgulhosos e decididos, do legado social e cultural que nos deixou, o qual
depõe nas nossas mãos uma fabulosa ferramenta para a prossecução dos ditosos
trilhos do futuro.
Enfim, algo de marcante que
a sua memória nos obriga a preservar, na construção desse amado S. Tomé e
Príncipe que, tal como ela, todos desejamos mais próspero, mais justo, mais
solidário e mais digno
Fim/ Wildiley Barroca, Secretário-Geral da União Nacional dos Escritores e Artistas de São Tomé e Príncipe.